Naturalmente...

Há coisas que nem o diabo acredita: não ia à Ilha do Cabo há mais de dois anos.

Fiquei admirado. Diria melhor - atónito. Em cima da praia, o musseque cresceu. Junto ao mar, multiplicaram-se as lanchonetes. Não tarda, estarão as areias todas privatizadas. Construir-se-ão miradouros    para  ver o  mar  e  você terá de fazer a “despesa mínima”  ( como nas boates ) para tomar o seu banho.

Do outro lado ( ou seja, do lado da Baía ) constrói-se também - ou casas de habitação com a boa parecença de palácios, ou mais lanchonete sem qualquer parecença especial.

Isto de ilhas aqui por Luanda está a dar que falar. É o caso do Mussulo, é o caso da Ilha dos Pássaros. E  se alguém se começar a lembrar,  será o caso da Ilha dos Padres e da Ilha dos Burros que, sem qualquer mau sentido, foi  nos tempos oferecida à União dos Escritores.

E a propósito de burros que são animais sem propósito algum, há quem diga que os jornalistas são mestres em fazer críticas sem apresentar nem sugestões, nem propostas de solução. Como se o jornalista ( ou com ele qualquer outra pessoa ) não pudesse criticar, dizer mal, dar uma simples opinião, apontar para onde o sapato lhe aperta só porque não sabe como se fazem  os sapatos. Como se eu, ao falar da Ilha, fosse agora  obrigado a  saber tudo, para ensinar o senhor governado a resolver  os problemas que é visível que esta ilha tenha.

Quem iria acreditar se eu chegasse aqui e dissesse: “ meu caros amigos, é fácil resolver este problema. Pegando no que há uns meses atrás  muito bem disse na Assembleia Nacional  um dos  Senhores Vice Governadores, informando que a maior parte das lanchonetes estão ilegais ( ainda que protegidas por bilhetinhos e recomendações, como igualmente afirmou); Atendendo a que se formos compulsar legislação ainda não revogada, as casas de habitação estarão possivelmente e também em situação irregular; Considerando que  as leis  são feitas,  para cumprimento igual de quem quer que seja, é fácil resolver esta questão - pegue-se no tractor e proceda-se, do mesmo modo determinado e firme, com que, de quando em vez, se derrubam  outras casas sem licença.

Mas quem é que me iria acreditar se eu falasse assim? Claro que ninguém, porque uma medida destas é não só drástica como, direi mesmo, fundamentalista, pouco política, economicamente gravosa dos interesses imediatos do Estado, por causa das indemnizações  a que seria obrigado.

Daí que eu faça uma outra proposta: ...

... que assim como existem reservas de caça em Angola, reservas de índios nos Estados Unidos, se façam aqui em Luanda, reservas de Praias Estatais Gratuitas ou de Baixo Custo. Mesmo que não sejam para tomar banho, porque naturalmente estarão poluídas,  servirão para mostrar aos nossos filhos e netos como é que as praias  antigamente eram, quando pertenciam a todos.



E embalado nesta fluência de propostas, talvez pudesse imaginar uma última, aconselhando a que não se  faça nada, mas se acabe ( por uma questão de transparência) com o Ministério do Turismo que não tem realmente nada para fazer ( pelo menos, ilhas já não terá).

Porque afinal, que turismo poderemos nós oferecer aos de dentro e aos que de fora  visitam as nossas ilhas?

Naturalmente, o turismo privatizado do ar, das águas, das praias e das areias...

Naturalmente, o turismo  futuro das lanchonete: beba, pague, tome banho e pisgue-se...

Naturalmente, um turismo que não será para nós. Será, como soe dizer-se, não para quem quer ( nem para quem merece, como antigamente) mas para quem tem e quem pode.

Dario de Melo