Luanda - nome de Cidade



Porque tem a nossa cidade o nome de Luanda?

Diziam os entendidos que quando os portugueses chegaram a estas paragens, perguntaram a um habitante desta cidade que nessa altura ainda não era cidade, como é que se chamava a terra. E ele, o cidadão que ainda não era cidadão, julgando que eles se referissem a qualquer coisa que haveria por ali, terá dito: Luanda.

Digo eu, que estou no meu direito de também dar opinião, que tendo Paulo Dias de Novais chegado a estas terras, chamou o seu adivinhador ( que eles também usavam este tipo de feitiçarias) e disse-lhe:
- Dizei-me senhor, se aqui é terra de boa feição para nela  construirmos uma cidade?
Recolheu-se o adivinho e para mais de três hora esteve a estudar os astros, a deitar as cartas e a experimentar os búzios que aqui se chamavam zimbos e eram dinheiro
-       Senhor D. Paulo Dias, dizem os astros que aqui estabelecereis a vossa cidade, com a Graça de Deus e por mercê D’El Rei Nosso Senhor que Deus o Guarde. A vossa cidade será um grande furo para El-Rei e para os Reinos de Portugal, e um grande buraco para quem  venha a morar nela.. Chamareis a esta cidade Luanda - a lua que anda, posto que, sendo de sobejo esburacada, se semelha bastante à Lua, nosso planeta satélite que não tem pedaço sem buraco. Este é o vosso sonho. Esta é a vossa Lua. Esta será a vossa cidade de Luanda.
Ao longo dos séculos estudaram as autoridades a forma de melhor esburacar a cidade, fazendo juz ao nome que esta tinha. E de buraco em buraco chegamos aos dias de hoje,
em que os buracos atingem, pela longa e profunda experiência, uma qualidade e variedade insuperáveis.

Os buracos especializaram-se. Há-os para todos os gostos. Desde buracos de parte-molas que  trabalham para o sindicato dos mecânicos; buracos de chupa cócó que os colonos deixaram cá e vivem normalmente entupidos nas ruas e estradas; buracos de tira petróleo que quanto mais eles tiram no mar, menos a gente tem no bolso para comprar o dito; buracos de angolano fino e estrangeiro que fala grosso que são esses buracos que a gente pensava que só moravam nas Lundas, e afinal, estão a morar em todos os lados de Angola.

Há ainda, inventados há relativamente pouco tempo, as ravinas que são buracos geofágicos porque comem terra e  destróem as árvores, as casas, os aeroportos e mais quê; São também conhecidos por buracos errantes que andam por aqui e por ali e não vão a parte nenhuma. Esburacam-se só para chatear.

Porém,  e continuando a ser a família a célula da sociedade, há ainda os buracos familiares,  que são aqueles que vivem à porta da nossa rua, junto da nossa família. São buracos familiares por duas razões: uma, porque vivemos com eles há mais de quinze e vinte anos; outra, porque o buraco grande que é o pai e o buraquinho  feminino que é a mãe fizeram aqui a sua ninhada. Como estamos em África, onde  não se conhecem os métodos nem as pílula da limitação da natalidade e do espaçamento de nascimentos, são sete os buraquinhos pequenos e seguidos que são os filhos.

E assim chegamos ao fim deste esburacada crónica sobre Luanda, terra de grandes buracos ( buracos no chão, buracos nas casas, buracos nas Repartições, buracos aqui, buracos acolá) que há até quem pense assim:

- Com tanto buraco, não seria melhor, em vez de governo, arranjar um catrapiler para aterrar tudo?

Pois é, digo eu: você consegue aterrar um buraco, mas será que ele fica definitivamente enterrado? E como é que você consegue enterrar  um buraco grande, sem ter de abrir outro buraco maior?

Esta, a dificuldade que a gente tem : enterrar um buraco sem abrir outro buraco. Eis o caso!

Dario de Melo