A Culpa do Governo
Pegue em sessenta artista e diga que vai levá-los ao
estrangeiro. Pode ser, por exemplo à Àsia. A Hong-Kong, ou a Macau.
Dê
entrevistas à Radio, à televisão e aos jornais. O acontecimento merece: o nome
de Angola nas montras do mundo asiático. Escreva ao nosso embaixador da China.
Pode ser que ele por lá arranje qualquer coisa e a caravana em vez de ir so a
Hong-Kong e Macau vá também a Beijing.
Politize a situação. Fale na necessidade política de
dois povos se conhecerem. Nas mútuas vantagens económicas, cuturais, etecetra.
Peça uma entrevista ao Embaixador da China em Luanda. Ele é um diplomata
educado, nunca lhe dará um não rotundo. Naturalmente dirá que vai estudar o
assunto. Dê uma outra entrevista e diga o que não é verdade mas também não é
mentira:
- O Senhor Embaixador
escutou com agrado a nossa proposta e está neste momento a estudar
cuidadosamente a oportunidade da nossa deslocação
Aqui chegado solicite um patrocínio ao governo de
setecentos mil dólares com os mesmos argumentos. Artistas que se deslocam à
China ( não diga quantos, nem fale das vantagens económicas, que toda a gente sabe que não serão nenhumas)
e fale das demarches já encetadas
junto da nossa Embaixada em Beijng e da Embaixada Chinesa em Luanda. Pode falar
da disponibilidade e atenção com que o Senhor Embaixador da China o ouviu.
Peça igualmente patrocínio às grandes empresas
sedeadas em Luanda (nacionais e estrangeiras). Às empresas que fazem contas,
peça unicamente sem avançar números, às restantes, em que o dinheiro cresce por
milagre, vá pessoalmente e avance com cifras na ordem dos vinte e trinta mil dólares. Diga que
fulano já deu, que eles normalmente, não gostam de ficar atrás...
Dê mais entrevistas. Pressione. Faça-se acompanhar
de alguns artistas de prestígio.
Dá seriedade ao empreendimento. Aguarde. E agora que já trabalhou o suficiente,
faça um intervalo e considere duas hipóteses:
Ou o governo dá para aí uns quinhentos mil e você com
mais os milhares que conseguirá no privado não vai, naturalmente levar os sessenta mas uns vinte. Queixe-se
do “caché” incomportável que os restantes exigiam. (Os restantes ninguém saberá
quem são, porque você teve o cuidado de só falar com dois ou três... Todos são
os restantes, e ninguém será o restante).
A tourné realiza-se e você vai, mete uns quantos mil
no bolso e regressa como herói nacional, pronto a outras iniciativas culturo-lucrativas
e possivelmente de maior monta, ganha nome nas embaixadas e, quem sabe, dá nas
vistas o suficiente para levar as pessoas a pensar que o falecido Ministério da
Cultura não lhe ficará assim tão mal e o ressussite. Dinâmico, inteligente, bem
relacionado, o que é que afinal queremos mais?
Segunda Hipotese: o Governo não lhe dá nem
quinhentos, nem cem, nem nada e você numa entrevista fala da falta de sensibilidade política e cultural
do governo que deitou abaixo todo
um aturado trabalho de mobilização e lhe fez perder um considerável volume de
dinheiro ( que foi, como se sabe, nenhum) que são os tais dólares que os parvos
lhe deram e você, naturalmente, não devolverá porque os “gastou” nos preliminares
desta acção.
Como vê – negócio fácil, sempre lucrativo e sem
grande suor..