Mais Uma Vez Maître Baye

Quando alguém morre é importante que lhe enterrem o corpo e lhe falem na alma. Era assim que diziam os antigos. Por isso se faz uma procissão de choros e lamentos no enterro  e se ora pelo eterno descanso da alma de quem se finou.

Quando alguém morre, suspeito de ter sido de morte provocada, para além do enterro e das cerimónias de culto apropriadas e habituais, é mister que a polícia investigue em que circunstâncias a morte terá ocorrido.

Isto para dizer que as homenagens que se fazem a Maitre Baye e a todos quantos com ele morreram, sem se saber ainda o que na verdade lhes terá acontecido ( o próprio Conselho de Segurança diz que também não sabe) me parecem, um como que dizer que estejam descansados que nós não estamos esquecidos. Uma espécie de tributo de consciência dos que talvez saibam ( ou imaginam, ou concluam) e não dizem porque não podem.

Ninguém queira fazer-nos acreditar que a ONU não tenha especialistas capazes de chegar num mês, às conclusões a que não chegou num ano. Isto, a menos que tenham sido postos no terreno, funcionários escolhidamente incapazes e incompetentes para não chegarem a conclusão alguma.

Como não acredito em crimes perfeitos ( a menos que não tenha havido crime) em Janeiro deste ano escrevia sobre o assunto, as linhas que hoje  repito e que, infelizmente, continuam actuais:

Maitre Baye morreu. Coisa que toda a gente sabe e ninguém esquece. O que se vai esquecendo, é que nos foi prometido, por quem tinha de explicar as circunstâncias em que o caso se dera, a razão porque ele morrera.

Quer dizer: se Maitre Baye foi morto porque um acidente o vitimou; se Maitre Baye morreu, porque propositadamente colocaram no avião ( dentro ou fora, as más línguas dizem que mesmo debaixo do seu assento) um artefacto qualquer que tivesse feito explodir o avião.

A Monua terá deixado para mais tarde o que em qualquer parte do Mundo se poderia ter explicado logo. Terá tentado resguardar com o silêncio, a Paz que parecia mais ou menos bem encaminhada. Não se podia sobrepôr à morte  de meia dúzia de indivíduos   ( Maitre Baye e os seus funcionários ) as esperanças de Paz de um povo inteiro. Não se deveria abrir um nova frente na batalha de acusações que então se faziam.






Porém, agora que a Paz já não existe, e as esperanças dela parecem passar pela voz atemorizadora Canhões;

Porém, agora que Dezembro passou, e a promessa de se saber como morreu Maitre Baye, parece ter sido esquecida;

Porém, agora que o silêncio é total, que ninguém diz palavra, que o próprio Maitre Baye parece nunca ter existido, será altura de se ouvirem as conclusões a que chegaram os peritos sobre este acidente, a menos que a Monua ( que viu, como coisa pouca, rearmar exércitos nunca desmobilizados ) não queria de novo, a bem da Paz que já não há, sobrepesar de culpas e mais uma vez, um dos assinantes do Acordo de Bicesse.

A democracia tem segredos e conveniências muito pouco democráticas, quando julga que se todos devem votar, só alguns têm o direito a saber e a decidir.

Assim foi com Kennedy – hipoteticamente morto por um, que foi visivelmente morto por outro, e afinal, não terá sido morto por ninguém, porque ainda hoje não se sabe muito bem como tudo se terá passado.


Se isto aconteceu com Kennedy que era, na altura,  o homem mais poderoso do mundo;

Se isto aconteceu com Kennedy, presidente idolatrado como nenhum outro, bem visto por todos como sabemos, olhos de pioneiro na política americana para o caso de África, o que não acontecerá com o  Maitre Baye que era tão somente o enviado especial do Secretário Geral das Nações Unidas?

Voltando outra vez à questão: do que nós precisamos de saber é se foi bomba, ou se foi míssil, para nos pormos a adivinhar: quem tinha armas ali ( do lado das bombas ou dos mísseis). Quem eram os amigos do Presidente de lá e quem se esteve nas tintas para os embargos da ONU, e quem finalmente sabia, confiou, tinha a certeza, de que para além do peso da verdade, valeria muito mais a força subornante do silêncio definitivo...

Todos nós havemos de morrer um dia. Mas em África, onde ninguém morre de morte natural, precisamos  de ir ao quimbanda para saber qual foi o feitiço que lhe matou. Foi de bomba, ou foi de míssil, o feitiço que levou o Maitre Baye? É só dizer, meus senhores, que à falta de melhor a gente acredita.



Dario de Melo